Sem ela,
definitivamente, não dá!
Agora são
três e meia da madrugada. Apesar do horário, faz muito calor. Como sempre estou
acordado pensando nela. Um reflexo de luz que entra pela janela caprichosamente
começa a desenhar algo na parede em minha frente. Acompanho atentamente o
movimento oscilante e percebo que parece desenhar um violão. Não! Parece um
corpo de mulher, e é, inclusive o rosto está se delineando. O desenho está
pronto. Meu Deus! É ela! Não acredito! Com certeza é a silhueta dela. Por um
instante penso que aquela sombra na parede é o reflexo real dela e procuro com
os olhos por onde ela possa estar. A saudade aumenta e vagueio em mil
possibilidades de poder encontrá-la e trazê-la até mim. Começo a senti-la do
meu lado. Sinto seu cheiro, sua respiração e seu hálito. Tudo muito real.
Levanto para verificar com minúcia a origem daquela projeção que vem da janela,
mas meu corpo, que sem ela, são mais de cem quilos de um vazio imenso, me
segura, dizendo: "Não seja tolo, estamos num quarto andar de um
apartamento. Não se engane, não me engane. Seus pensamentos voam, mas ela não
pode flutuar no ar como um beija-flor e de repente surgir pela janela".
Então, inconformado com essa verdade, volto a deitar e, apesar do calor sinto
um frio e um calafrio. Meu corpo sofre. Pensamos no jeito peculiar dela, na sua
sensualidade e nos seus trejeitos e carinhos tão singulares. Eu e meu corpo,
solidário um com o outro, tentam se consolar, mas no fundo entristecem, sabendo
que ela não voltará. Então, desesperançosos, esfacelamos sem compreender a
razão dela não estar aqui.
A
madrugada, tão amiga minha, achando que está me fazendo bem, insiste em
sombreá-la por todos os cantos da casa, intensificando o meu desejo de vê-la e
tento sufocar esse amor para não estimular mais ainda o meu corpo também muito
carente dela, mas esse amor é latente e palpita no escuro em cada célula
minha. Viro-me na cama por todos os
lados, incapaz de sequer pensar no sono, começo a transpirar e chorar sem
consegui me controlar. Ouço um barulho imenso. É uma explosão. Uma explosão
interior que com espasmos constantes me balança por inteiro e me deixa mais
agitado ainda. Levanto, lavo o rosto, bebo água e a madrugada, minha companhia
de insônia, dessa vez parece querer me pirraçar, pois já notou a minha
angústia, mas mesmo assim se recusa a amanhecer. São cinco horas, estou incendiando de
saudades, meus pensamentos vagueiam mais uma vez, dessa vez num quase delírio.
A madrugada dessa vez percebeu o meu estado e mesmo não sendo hora de chamar o
seu amante, o dia claro, dá-lhe um toque sutil e os dois, cochichando, se
beijam, despedindo um do outro e marcando um encontro para depois. O dia claro
toma o ar da graça e me expõe com um semblante carregado e triste, mas tentando
me entreter com outras coisas, deixa o sol também se fazer presente, querendo
me dizer, que é hora de levantar, de trabalhar e começar mais um dia. ...Não
adianta! Mesmo no barulho da agitação da cidade, na agitação do meu local de
trabalho, mesmo no meu computador, só
vejo o seu rosto, o seu jeito e sua maneira distinta, maravilhosa e exclusiva
de ser mulher. Eu a amo
tanto, tanto...